Chamam-lhe os bolinhos “CDS” e só a D. Mariazinha, como é conhecida em Freixo de Espada à Cinta, sabe a receita.
“Comecei por aprender com uma senhora muito antiga, daqui de Freixo, que achava que ninguém fazia os doces como ela”, contou.
Os famosos “CDS” aprendeu-os em Freixo, mas quem a ensinou chamava-lhe “papos de anjo”. D. Mariazinha, no entanto, garante que “não tinham nada a ver com a receita tradicional de papos de anjo” e por isso, alterou-a.
A receita até pode parecer simples, “são apenas ovos, chila e amêndoa”. A confecção, essa, é segredo da casa e o nome “CDS” apenas um “acaso” que nasceu de um congresso com Freitas do Amaral.
“Depois do 25 de Abril de 1974, o CDS organizou um congresso no Porto e, na altura, levei uns bolinhos destes para o Freitas do Amaral”, recordou. Já de regresso a Freixo e com os bolos a ganharem fama, eram muitos os que questionavam o nome, talvez na tentativa de descobrir o segredo.
“Havia um médico que andava sempre a perguntar o nome dos bolos e como soube que eu tinha ido ao congresso, disse-me que lhes chamasse os CDS”.
Assim ficaram até hoje e nem os adversários de outra cor política lhe resistem. Mário Soares é um dos exemplos, “ainda o ano passado lhe mandei uma encomenda”, contou sorrindo.
D. Mariazinha ainda recorda o primeiro contacto de Mário Soares com os “CDS”.
“O doutor vinha a Freixo em propaganda, no pós 25 de Abril” e D. Mariazinha estava encarregue do almoço e da doçaria regional, “como ainda hoje acontece sempre que há visitas à região”. Curiosamente, Mário Soares parece ter “adorado” os “CDS” e nem quando soube o nome perdeu o entusiasmo pela especialidade.
“Eu não queria que lhe dissessem o nome, era uma altura complicada e ele era adversário do Freitas do Amaral, mas os mandatários dele não resistiram a contar”.
Diz a doceira que quando soube o nome dos ditos respondeu, “são muito bons e até vou comer outro que eu dos CDS até gosto”.
Desde então, as encomendas não pararam de crescer. São os “CDS”, as “castanhas”, os “arrepelados”, os “manuéis”, tudo doçaria antiga, à base de gemas de ovos e muita amêndoa. Depois há ainda quem confunda as “castanhas” com os D.Rodrigos, do Algarve, mas “esta é uma receita freixinista, muito antiga, ainda nem o Algarve era Portugal”, atestou a especialista, explicando as diferenças da massa das “castanhas” da “massapão”.
Embora as receitas sejam tradicionais de Freixo de Espada à Cinta, “há poucos que as saibam fazer como deve ser porque são massas muito trabalhosas”.
Por exemplo, “as castanhas dão muito trabalho a fazer”. Desde a partidela da amêndoa, ao descascar, até à confecção, “é como os serões da província”, mas “dá para eu me ir entretendo durante o ano”.
Outra das particularidades dos doces da D. Mariazinha é que “só levam a amêndoa de Freixo, que lhe dá um sabor peculiar” e nem sabe quantificar as centenas de quilos que usa durante o ano.
A ajudá-la nestas lides tem a filha que, embora viva no Porto, costuma vir até Freixo ajudar a mãe nas encomendas de doces.
“São receitas muito antigas”, apontou, exemplificando com um bolo encomendado que “demora três dias a fazer e coze sete horas no forno”.
A curiosidade, segundo diz, é que “estes bolos surgiram como forma de aproveitar as gemas, já que as claras eram usadas para engomar a roupa”.
“As pessoas conhecem as receitas, mas não têm paciência”, desabafou, rematando que “são bolos feitos por amor”.
Curiosamente, é um amor que não está ligado à gula. Nem a D. Mariazinha nem a filha gostam de doces de amêndoa, “são gostos, não se discute...mas não os provo...”, contou sorrindo.