O juiz que julgou o caso, Filipe Borges, não tem dúvidas de que Júlia Dinis teve um aborto provocado por uma aspiração baseada na leitura de uma ecografia em que a bexiga cheia foi confundida com uma bolsa gestacional vazia.
O "diagnóstico erróneo" de uma falsa gravidez foi feito pela obstetra Maria Joaquina e seguido pela colega Adelaide Palhau que procedeu à aspiração sem questionar os resultados apesar de ser médica assistente da queixosa e de ter sido ela que confirmou anteriormente, com exames, a gravidez.
De acordo com o tribunal, a ecografia desapareceu "inexplicavelmente".
As análises feitas ao produto que resultou da aspiração inicial no hospital de Bragança e nas cirurgias realizadas posteriormente no Hospital de Vila Real, confirmaram a existência de "restos fetais".
O julgamento teve início em Julho e depois de vários meses a analisar provas e a ouvir testemunhas e peritos, o tribunal mandou arquivar o caso porque concluiu que afinal a queixa que deu origem ao processo foi apresentada com três anos de atraso.
A lei estipula um prazo de seis meses e, neste caso, a queixa só chegou ao tribunal em 2005, quando os factos ocorreram em Outubro de 2002.
"É um caso que é trágico", admitiu o juiz Filipe Borges, "pelo que aconteceu no hospital, por a queixa ter sido apresentada três anos depois e por o pedido de indemnização" não ter sido dirigido a quem de direito.
A queixosa viu também negado o pedido de indemnização de cerca de 180 mil euros dirigido às médicas, mas que afinal devia ter dirigido ao hospital.
"Ainda está a tempo de por uma acção no tribunal administrativo contra o hospital. A condenação é certa. O tribunal apela que essa acção seja proposta", disse o magistrado.
O juiz deu como provado que "houve erro médico" e apesar de entender que não houve dolo (intenção) considerou que houve negligência e que era possível condenar as médicas por violação da "leges artis" (regras da ciência médica).
"Ambas não actuaram com o cuidado a que estavam obrigadas e eram capazes", concluiu o juiz.
A queixosa Júlia Luís reconheceu que 2002 "foi um ano de azar", pelo que aconteceu com as médicas e por ter entregado inicialmente o caso a um advogado que lhe cobrou mil euros e não avançou com o processo.
Apesar de tudo, diz estar "em paz" e espera que o seu caso sirva "de exemplo para que elas (as médicas) olhem com mais atenção quando tocarem numa mulher grávida".
A queixosa que entretanto teve uma filha, agora com cinco anos, ainda não sabe se vai avançar com o pedido de indemnização ao hospital.
"Não é uma questão de dinheiro porque não há dinheiro que pague o que eu sofri", declarou.
O advogado Rogério Palhau, defensor da obstetra Adelaide Palhau, admitiu que "é objectivo que havia um feto", mas considerou que "foi feita justiça porque nunca houve dolo" por parte da sua cliente.
"Houve uma conjugação de circunstâncias que levou a este desenlace, que nunca foi desejado", afirmou, realçando que a acção da médica assenta "num diagnóstico imbatível - a ecografia".
A outra arguida não prestou declarações.
Fonte: Lusa