Há muitos anos que a aldeia de Vale de Salgueiro, Mirandela, é conhecida por uma tradição que divide opiniões sobre as possíveis consequências futuras. Na noite do dia 5 de Janeiro, as crianças são incentivadas pelos familiares a fumar cigarros.
"Nessa noite, são os familiares que compram os maços de tabaco para dar aos garotos", explica Roger Lopes, o presidente da Junta de Freguesia.
Ninguém sabe ao certo como e quando começou esta estranha tradição, nem tão pouco o que ela possa significar.
"Sei que se trata de uma festa secular porque os mais idosos já não se lembram de quando terá começado, mas falou-se em tempos que os mais jovens fumavam para simbolizar a emancipação", acrescenta o autarca.
Também Emília Tomé, habitante de Vale de Salgueiro, revela que esta tradição é longínqua, porque a sua mãe "faleceu com 94 anos e não tinha ideia de quando terá começado", diz.
Mas nesta festa dos Reis - também chamada festa dos rapazes - é sempre escolhido alguém da localidade para protagonizar a figura do Rei, que tem a seu cargo a organização da festa e que ostenta uma coroa revestida a veludo e adornada de objectos em ouro emprestados pelos habitantes, como símbolo de riqueza e poder.
"Este ano vai levar muita fantasia porque temos medo de um assalto", conta a avó de Ângelo Belchior, o jovem de 18 anos que foi escolhido para ser o Rei de 2009. A festa dura dois dias. Na noite de ontem, o Rei percorreu todas as habitações da aldeia, sempre com o grupo de gaiteiros a acompanhar, distribuindo cerca de trezentos quilos de tremoços e cem litros de vinho, em cabaças tradicionais.
Entretanto, no centro da aldeia prepara-se o baile com uma aparelhagem sonora e, quando o Rei chega, as pessoas presentes são convidadas a dançar a "Murinheira", (típica dos Celtas) ao som das gaitas de foles e dos bombos.
Esta terça-feira, a alvorada acontece às seis e meia da manhã. O Rei, ao som das gaitas de foles e dos bombos, volta a percorrer toda a aldeia para receber a "manda" (donativos) para custear os cerca de dois mil euros de despesa.
No final da manhã, a festa termina com a celebração da missa, ocasião aproveitada para colocar a coroa em outro habitante da aldeia que terá a responsabilidade de organizar a festa de 2010. O Rei não esconde a satisfação em ser o protagonista e é mesmo um claro exemplo de como a tradição das crianças fumarem pode não ter consequências negativas.
"Quando tinha oito anos, fumei vários cigarros, na festa, e agora já tenho dezoito e não sou fumador". Conclui.
Também António Fernandes, de 49 anos, não vê mal nenhum nesta tradição.
"Cerca de 90% do pessoal da minha geração, não fuma, apesar de o ter feito quando eram crianças", garante.
Fernando Pires in JN
Foto: Mensageiro Notícias