Dia-a-dia de um distrito rural, doze concelhos e meia dúzia de pequenas cidades encravadas nas montanhas mais a norte de Portugal
07 de Outubro de 2010

De uma conversa de café à realização de um projecto cinematográfico, a história de uma média metragem que retrata o despovoamento das aldeias transmontanas explicada pelo seu realizador, Rui Pilão

 

Licenciado em Bsc(Hons) Sound Technology pela University of Glamorgan, Rui Pilão, natural de Bragança, foi às raízes da sua origem para abordar o tema do despovoamento, dando sentido à frase de Fernando Pessoa - “o homem sonha, a obra nasce”. Em entrevista, o jovem conta como conseguiu dar corpo a este projecto cinematográfico, contando apenas com a boa-vontade de um conjunto de instituições e de um grupo de amigos que quis agarrar este desafio

 

Como é que nasceu o argumento desta média metragem?

 

Rui Pilão: A ideia surgiu aquando do reencontro entre mim e Aurora Morais, numa conversa de café, sobre uma exposição que ela estava a organizar com Tiago Ribeiro. Daí e depois de ter sugerido uma foto, que vem a retratar o final do filme, surgiram outras ideias. Nesta troca de opiniões que fui transmitindo à Aurora Morais, surgiu um conto, da autoria dela, no qual começa a ser “desenhado” um personagem que tem as características físicas do actor Leandro do Vale, que aparece, assim, como o actor ideal para dar vida à personagem.

Eu aceitei a sugestão de bom grado, e, sinceramente, também me convinha a mim tê-lo na equipa. Depois do conto, nasceu o argumento, escrito por mim. Tentei não fugir ao conteúdo do conto, mas organizei e alterei o necessário de modo a que se tornasse em algo “filmável” e não tão literário.

 

É a primeira vez que assume a realização de um filme e escreve o seu argumento?

 

R.P.: Oficialmente sim, é a primeira vez que assumo a realização de um filme. Sou bastante reservado e paciente, durante vários anos fui evoluindo por conta própria, fazendo curtas experimentais. Tentei evoluir até me sentir confiante de que começaria a minha carreira de forma a ser notado logo de início. Vão ter oportunidade de observar o meu empenho e dedicação neste filme.

 

Onde é que foram realizadas a maioria das filmagens?

 

R.P.: A maioria das filmagens, vou até mais longe, as cenas realmente necessárias, foram todas filmadas em Vilar d’Ossos.

Filmamos dois “take’s” num descampado em Tuizelo, onde o cão passeia, mas não posso garantir que irão ser usadas, é uma questão que só será explorada na edição.

 

Como é que a população local se envolveu neste projecto? Que reacções é que tiveram das pessoas?

 

R.P.: A escolha do local de filmagens principal, Vilar d’Ossos, não foi por mero acaso. Tive em conta os vários cenários possíveis, mas acima de tudo os contactos e influência que dispunha. Neste caso, tinha o apoio dos meus avós, Carlos Paula e Hermínia Paula, que me ajudaram a contactar as pessoas necessárias. Tudo o que obtivemos, foi graças a boa vontade da população local.

Temos que agradecer à dona da casa onde filmamos, Teresa Martins, à responsável e zeladora pela capela, Iria Ferreira, a Nuno Fernandes pelo suporte que nos deu nas filmagens com a sua retroescavadora, que foi usada como grua.

As pessoas reagiram com curiosidade e expectativa, visto que algo deste género não é usual naquela região, e estão desejosos de ver o resultado final.

 

Qual foi o apoio que a Junta local vos prestou? Sei que foi concedida licença para abrirem uma cova no cemitério apenas para efeitos cinematográficos e que tal não é fácil de conseguir...

 

R.P.: A boa vontade não partiu só da população local. A Junta de Freguesia de Vilar d’Ossos deu o apoio mais relevante. Deram total liberdade para filmarmos a aldeia, os caminhos, e deram autorização para abrirmos cova no cemitério, isso é algo que devemos agradecer especialmente ao presidente da Junta de Vilar d’Ossos, Manuel Martins, assim como ao secretário, Luís Morais.

A Junta de Tuizelo também nos recebeu de uma forma muito calorosa e ofereceram o almoço.

 

Como realizador, quais foram as principais dificuldades encontradas para levar a cabo este projecto?

 

R.P.: Sinceramente, gerir a equipa. A maior dificuldade foi mesmo essa. Tanto o Tiago Ribeiro como o Leandro Vale são conhecidos da Aurora e não meus. Mas eu conhecendo a Aurora e esta sendo a produtora como título escolhido de início, confiei na escolha dela, tal como qualquer realizador confiaria no meu lugar.

Muitas coisas estavam em jogo, não tínhamos orçamento, por isso, não podia dar-me ao luxo de exigir tanto dos elementos que formaram a equipa, como exigi de mim para compensar divergências de personalidade e também na parte técnica, visto que não dispúnhamos de material necessário.

Todos os elementos foram escolhidos porque não exigiam compensação monetária, mas também porque, no caso do Tiago Ribeiro, ele tinha a câmara necessária para as filmagens.

Com isto não quero dar a ideia que foi tudo para “desenrascar”, mas infelizmente quando não dispomos de meios suficientes, acaba mesmo por ter que se tomar decisões mais ao estilo do “desenrasca” e isso pode criar algum desconforto a nível humano, mas neste caso, felizmente, não pôs em causa a qualidade do filme.

 

Quando é que vai ser feita a edição e quando é que a média metragem estará pronta?

 

R.P.: A edição vai ser feita em Portimão, por Paulo Lourenço e Pedro Gerardo, com a minha colaboração. São dois amigos que conheci na universidade que frequentei. 

A edição vai iniciar no dia 8 de Outubro, sendo que as datas seguintes dependerão da disponibilidade de cada um. A previsão é que, no máximo, estará pronto no final de Outubro.

 

Qual é o objectivo e a grande motivação deste projecto?

 

R.P.: A minha maior motivação foi trazer aquilo que eu aprendi no estrangeiro e adaptá-lo de forma a que possa dar algo de volta a região onde eu nasci e vivi até à idade adulta.

Acho importante não nos esquecermos da nossa origem, principalmente se esta vier de uma região do interior. Já basta que o próprio país se faça de esquecido.

O tema deste filme retrata o despovoamento das aldeias, o abandono dos idosos e, infelizmente, é uma realidade. Mas a solidão não é o único problema, a grande perda é a nível cultural e, mais importante do que isso, é a perda de tradições, do que nos torna portugueses, traduções que morrem com as aldeias.

 

Sei que pensam enviar a média metragem para festivais de cinema nacionais e internacionais. Quais é que serão os festivais prioritários, aqueles que vocês vão mesmo apostar?

 

R.P.: Os festivais prioritários a nível nacional são o Fantasporto, o IndieLisboa e o Curtas Vila do Conde. A nível internacional pretendemos concorrer no "Short Film Corner" de Cannes e no Berlin Film Festival. No entanto, existem várias regras impostas pelos festivais que vamos ter em conta e isso só acontecerá na devida altura.

 

Depois deste projecto filmado, maioritariamente, em Vilar de Ossos, Vinhais, há intenção de voltar a apostar em algo similar e usar as paisagens transmontanas como cenário?

 

R.P.: Trás-os-Montes é sem duvida uma região muito rica em paisagens bonitas, só por isso acho muito provável algum outro projecto surgir no futuro.

Posso revelar que já tenho algo de maior envergadura em stand by, e que vai envolver a cidade de Bragança, se conseguir obter um maior apoio, desta vez monetário.

Sou uma pessoa motivada por natureza e não vou deixar de fazer as coisas só porque não entendem a minha visão, mas é sempre agradável ser apoiado, até porque acho que todos beneficiam quando uma certa região é valorizada a nível cultural, principalmente se for por um projecto bem conseguido, e isso requer dinheiro.

É preciso que as entidades competentes entendam que quando alguém, como eu, se esforça por trabalhar no interior está a partilhar mais do que a sua ideia, no meu caso, está a divulgar a região numa linguagem universal e actual que vai atingir um vasto público e vai atrair turismo.

Nós, interior, podemos existir, mas eu procuro que tenhamos relevância.

 

Média metragem rodada em Vilar d’Ossos

Rui Pilão foi o realizador da média metragem intitulada “Aqui jaz a minha casa”, uma produção independente que aborda o tema do despovoamento e da solidão dos idosos. Para dar corpo a este projecto o jovem reuniu-se com um conjunto de amigos que, a título gratuito, quiseram participar. A par das juntas locais de Vilar d’Ossos e de Tuizelo, o grupo contou com o apoio da câmara de Vinhais e do Cybercentro de Bragança.

São 30 minutos que retratam a solidão na primeira pessoa e que colocam o actor Leandro do Vale como personagem principal, a única do filme, a par do seu cão Tobias.

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